Mercado de carbono é peça-chave para a competitividade das empresas brasileiras
Em setembro, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) lançou o estudo “Mercado de Carbono: análise de experiências internacionais”. O levantamento feito pela entidade apresenta elementos comuns que possam ser úteis para a reflexão sobre a governança de um mercado de carbono no Brasil.
Às vésperas da COP-26 e da expectativa em torno da regulamentação do Artigo 6º do Acordo de Paris, que trata do mercado global de carbono, o gerente-executivo de Meio Ambiente e Sustentabilidade da CNI, Davi Bomtempo, reforça, nesta entrevista à ABiogás News, a necessidade de o Brasil instituir um sistema que integre os mercados regulado e voluntário de carbono. A criação de um mercado, em lugar da taxação de emissões, evitaria o aumento dos custos de produção em setores que têm limitações para reduzir suas emissões, avalia o executivo.
Para Bomtempo, o estabelecimento de um mercado nacional de carbono é fundamental para manter e ampliar a competitividade das empresas brasileiras no mercado internacional. “O Brasil, caso não acompanhe esse processo, pode ser impactado.”
A CNI lançou recentemente um estudo que analisou experiências internacionais no mercado de carbono. Como esse levantamento contribuiu para estabelecer o posicionamento da confederação nos debates do mercado de carbono no Brasil?
O estudo analisou iniciativas de Sistemas de Comércio de Emissões da União Europeia, México, Western Climate Initiative (WCI) no Canadá e Califórnia, Japão e Coreia do Sul. Esse levantamento nos apontou algumas questões comuns nesses mercados, como a importância da liderança do Executivo na criação e no desenvolvimento dos mercados, a descentralização relacionada à necessidade de integração entre jurisdições de diferentes países, a organização dos sistemas de compensação considerando a aderência ao MRV (mensuração, relato e verificação), dentre outros e a participação do setor privado na fase de planejamento até a implementação.
A partir desses elementos, construímos um texto considerando alguns aspectos fundamentais, como a criação de governança robusta com a participação do setor governamental e privado, a utilização dos recursos financeiros da comercialização de permissões para reinvestimento em tecnologia de baixo carbono e formas de interação com setores não regulados por meio do mercado de compensações.
Qual é a avaliação da CNI sobre o projeto de lei que cria o mercado de carbono no país? O que pode ser destacado como positivo e o que ainda precisaria ser melhorado?
A CNI, em conjunto com a base industrial, construiu um texto substitutivo ao PL 528 (do deputado federal Marcelo Ramos, que institui o Mercado Brasileiro Regulado de Emissões – MBRE), e vem negociando com os principais stakeholders no intuito de ter um texto redondo, que atenda aos pleitos de toda a sociedade.
A proposta da CNI está fundamentada na importância de um sistema que integre os mercados voluntários e o regulado, em que há uma centralização dos registros de redução de emissões realizadas via mercado voluntário, com o objetivo de permitir que o Estado reconheça e valorize esses ativos, incluindo-os em sua contabilidade nacional para fins de cumprimento de metas internacionais e de oferta de ativos ao mercado regulado.
Esse sistema de registro estará integrado a um mercado regulado com base em uma estrutura que garanta sua consistência e integridade técnica e de registros, assim como uma base de governança que permita a participação direta dos setores na construção de seus instrumentos, em especial os planos de alocação, o sistema de monitoramento, reporte e verificação e os mecanismos de estabilização de preços.
Que projeções a CNI faz de possíveis ganhos econômicos para a indústria brasileira com a aprovação de um mercado de carbono no país?
De acordo com o Banco Mundial, em 2020, as iniciativas de precificação de carbono movimentaram US$ 53 bilhões em receitas e cobriram cerca de 21,5% das emissões globais de gases de efeito estufa (GEE).
Um dos principais pontos em negociação no âmbito do Acordo de Paris se refere à criação do Mecanismo de Desenvolvimento Sustentável, que estabelece o mercado global de carbono. A ideia é dar continuidade à exitosa experiência do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) no Protocolo de Quioto, que gerou, segundo dados do Ipea (BRASIL, 2018), investimentos da ordem de US$ 32 bilhões nos últimos 15 anos na economia brasileira, evitando a emissão de 124 milhões de toneladas de emissões de GEE na atmosfera.
A demora na aprovação de um mercado de carbono no Brasil prejudica a competitividade da indústria brasileira no âmbito global?
Diversos países já estão implementando, em suas estratégias nacionais para mitigar os gases de efeito estufa, instrumentos de precificação de carbono, principalmente o mercado de carbono. Essa é uma tendencia global que tem movimentado cerca de US$ 53 bilhões em receitas só em 2020.
O Brasil, caso não acompanhe esse processo, pode ser impactado, principalmente quando falamos na competividade das nossas empresas frente aos principais competidores internacionais.
Ainda há riscos de o governo brasileiro optar pelo modelo de taxação das emissões, em vez do mercado de créditos? Se a escolha for pela taxação, a CNI tem projeções sobre impactos sobre a indústria e a competitividade das empresas brasileiras?
Acreditamos que já há um consenso, não somente no setor industrial, mas também toda a sociedade, incluindo governo, que não há espaço para incluir o instrumento de taxação no Brasil.
Estudo desenvolvido pela CNI “A Precificação de Carbono e os Impactos na Competitividade da Cadeia de Valor da Indústria” concluiu que uma eventual taxação de carbono no Brasil levaria ao aumento de custos de produção, uma vez que, não sendo possível zerar as emissões, alguns setores produtivos irão pagar mais tributos.
Foram mapeadas as seguintes perdas potenciais: redução de 800 mil postos de trabalho, queda de R$ 130 bilhões no PIB, aumento de custos e redução da atividade econômica em até 3%, quedas nas exportações em até 5% e aumento dos custos de insumos da indústria, sobretudo de energia elétrica (6%), transportes (16%) e combustíveis (22%).
ABiogás participa da COP-26 em debates sobre hidrogênio e mercado de carbono
O presidente da ABiogás, Alessandro Gardemann, está em Glasgow, na Escócia, para representar a associação na 26ª edição da Conferência das Nações Unidas para Mudanças Climáticas (COP-26). Alessandro vai apresentar o panorama do biogás no Brasil, focando no seu potencial de descarbonização da agroindústria. O executivo também levará a mensagem de apoio à regulamentação do mercado de carbono no país.
O presidente da ABiogás foi convidado pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA) para integrar a agenda de temas abordados pela comitiva do governo brasileiro na agenda que vai incluir um painel sobre biocombustíveis e energia. Para o executivo, é fundamental elevar a participação do biogás e do biometano na geração de energia no país, e é isso que ele irá reforçar na COP-26.
“A ABiogás vem ampliando sua atuação nos debates sobre o futuro da energia no Brasil para reforçar como o biogás e o biometano são combustíveis cruciais para garantir o abastecimento energético nacional de forma limpa e sustentável e como seu uso pode elevar o patamar de sustentabilidade do agronegócio brasileiro, reduzindo a sua pegada de carbono e ainda gerando créditos de carbono, tornando os projetos mais atrativos economicamente. O planeta precisa de energia e produtos mais sustentáveis, com alta renovabilidade e baixo impacto ambiental. Isso pode ser garantido com o biogás e o biometano. As mudanças climáticas provocadas pelas emissões de gases de efeito estufa são uma realidade cada vez mais difícil. A crise hídrica que o Brasil vive, a pior em 91 anos, é um exemplo óbvio disso. Portanto, precisamos agir agora, acelerando a substituição dos combustíveis fósseis por energético renováveis, como são o biogás e o biometano”, explica Gardemann.
A advogada Maria João Rolim, do escritório Rolim, Viotti, Goulart, Cardoso Advogados, associada da ABiogás, também estará presente na Conferência e abordará o tema do biogás em suas participações. Dra Maria João abordará o uso do biogás como insumo para a produção de hidrogênio verde – combustível que vem sendo apontado como promissor na redução das emissões atmosféricas. A advogada vai destacar como o biogás e o biometano podem ser extremamente vantajosos, tanto financeiramente como ambientalmente, na geração do hidrogênio, substituindo o gás natural de origem fóssil e também a eletricidade.
“Atualmente os debates sobre produção de hidrogênio estão centrados no uso de energia elétrica produzida a partir de fontes renováveis, como a eólica e a solar. Contudo, o biogás e o biometano podem ser utilizados para obtenção do novo combustível com custo menor e usando a mesma infraestrutura usada pelo gás natural, principal insumo utilizado hoje na produção de hidrogênio (nesse caso, o hidrogênio classificado como cinza). É preciso considerar o importante papel desses energéticos nesse novo mercado do hidrogênio”, aponta Maria João.
As participações de Alessandro Gardemann e Maria João Rolim na COP-26 podem ser acompanhadas nas redes sociais da ABiogás e também no site da associação.
Resumo do Mês
Veolia inicia operação de três novas termelétricas a biogás
Atuando na gestão de água, resíduos e energia, a Veolia iniciou em outubro a operação de três novas termelétricas a biogás. Com cerca de 12.400 kW de potência acumulada, as três plantas, localizadas em Iperó, na região de Sorocaba (SP), e em Biguaçu (SC), vão consumir 6.400 Nm³/h do energético gerado a partir de resíduos de aterros operados pela companhia. A energia elétrica produzida será suficiente para cobrir o consumo de cerca de 42 mil habitantes.
“Estas termelétricas fazem parte do plano estratégico mais amplo da Veolia no Brasil, que é transformar os centros de gerenciamento de resíduos em parques tecnológicos ambientais, com uma oferta aprimorada e integração de serviços voltados para a economia circular e a redução da pegada de carbono”, diz Pedro Prádanos, CEO da Veolia Brasil.
A Veolia opera seis aterros sanitários no Brasil, além de atuar em serviços de distribuição de água e tratamento de esgoto em Palhoça (SC). Além do investimento em geração elétrica a partir do biogás, a empresa está estudando a purificação do energético em biometano, para uso na rede de gás ou como combustível para automóveis.
Globalmente, a companhia possui grande experiência na área de saneamento, levando água potável para 95 milhões de habitantes e saneamento para 62 milhões de pessoas, além de já ter produzido cerca de 43 milhões de megawatt/hora, a partir de 47 milhões de toneladas de resíduos.
CBIO dispara na B3 com redução da produção de etanol de cana
A quebra na produção de etanol de cana na safra 2021/2022 gerou forte valorização dos preços dos Créditos de Descarbonização (CBios) na B3 em setembro. Os papéis foram negociados por R$ 40,57, em média, aumento de 48% em relação ao preço médio de agosto.
Outro efeito foi o aumento da liquidez do título. Foram negociados 11 milhões de CBios em setembro, o que corresponde a quase metade dos volume apurado entre janeiro e agosto, quando foram negociados 23,5 milhões de créditos.
Em relação às metas compulsórias das distribuidoras de combustíveis, as distribuidoras haviam aposentado 4,8 milhões de títulos até o fim de setembro. Outros 16 milhões de CBios tinham sido comprados por essas empresas, mas ainda não retirados do mercado. Como a meta global para 2021 é de 25,22 milhões de títulos, no fim de setembro faltavam as distribuidoras adquirirem 4,1 milhões de CBios.
Congresso Nacional lança a Frente Parlamentar de Recursos Naturais e Energia
No final de outubro, com a adesão inicial de 26 senadores e sete deputados, foi instalada a Frente Parlamentar de Recursos Naturais e Energia (FPRNE). A frente foi criada para promover debates, incentivos e propostas legislativas sobre políticas que estimulem o uso sustentável dos recursos e a geração e o consumo responsável de energia de todas as matrizes. Um dos objetivos do grupo é colaborar com a transição energética no Brasil.
O senador Jean Paul Prates (PT-RN) foi eleito presidente do grupo, que terá como vice o deputado Lafayette de Andrada (Republicanos-MG). Autor da proposição para a criação da FPRNE, Prates disse que outros parlamentares ainda podem se juntar aos trabalhos, e que a intenção é integrar todos os segmentos de energia, de modo a evitar competições predatórias.
“Essa é a grande frente do Congresso Nacional que vai reunir todas as fontes, renováveis e não renováveis, abordando aspectos sociais, ambientais e econômicos”, afirmou o senador.
Sete frentes parlamentares lançam coalizão pelas energias renováveis
Sete frentes parlamentares do Congresso Nacional lançaram uma coalizão inédita em prol de políticas voltadas às energias renováveis. O movimento é capitaneado pela Frente Parlamentar Mista do Biodiesel (FPBIO), com participação das frentes parlamentares da Agropecuária (FPA), do Setor Sucroenergético, de Defesa das Energias Renováveis, da Bioeconomia, de Desenvolvimento Regional e Sustentável e da Economia Verde.
A coalizão apresentou um documento para divulgar o potencial do Brasil na mitigação das alterações climáticas. “É um movimento único e inédito na história do Congresso Nacional. Deputados e senadores de sete frentes parlamentares e diferentes partidos unidos, pelo desenvolvimento nacional e pela sustentabilidade a partir do uso de energias e combustíveis renováveis, como o biodiesel e o etanol”, disse o deputado federal Pedro Lupion (DEM/PR), presidente da FPBIO.
De acordo com Lupion, expor como o país está engajado nos esforços pela descarbonização e pelo estímulo à bioeconomia servirá como importante ferramenta para que o mundo olhe para o país com o papel de protagonista. Principalmente porque o Brasil tem geração de oportunidades de maneira sustentável.
“O objetivo é fomentar e criar efetivamente uma biocoalizão no Congresso, junto ao setor produtivo e às entidades que o representam para que possamos mostrar que produzimos energia limpa e barata, combustíveis limpos e baratos e que nós temos desenvolvimento econômico com preservação ambiental.”
Está Por Vir
Edição 2021 do Fórum do Biogás terá representantes do governo e de empresas
Diversos representantes do governo, de empresas e de entidades setoriais já confirmaram presença como palestrantes do VIII Fórum do Biogás, que será realizado pela ABiogás em formato híbrido (presencial e virtual), no dia 25 de novembro. O evento presencial vai acontecer em São Paulo. As inscrições podem ser feitas no site do evento.
Entre os palestrantes da iniciativa privada e entidades setoriais estão confirmados:
- Maria João Rolim, do escritório Rolim, Viotti, Goulart, Cardoso Advogados;
- Ricardo Gomes, da Unilever;
- Lara Terra, da Yara Fertilizantes;
- Caio Mogyca, da Air Liquide;
- Talita Martins Oliveira, da Bureau Veritas;
- Juliana Falcão, da Confederação Nacional da Indústria (CNI);
- Newton Duarte, da Associação da Indústria de Cogeração de Energia (Cogen);
- Felipe Borschiver, da Climate Policy Initiative (CPI).
Do setor público, já confirmaram participação:
- A diretora de Estudos do Petróleo, Gás e Biocombustíveis da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), Heloisa Esteves;
- A coordenadora-Geral de Implementação e Fiscalização de Regimes Automotivos no Ministério da Economia, Margarete Gandini;
- A diretora de Regulação Técnica e Fiscalização dos Serviços de Gás Canalizado da Agência Reguladora de Serviços Públicos do Estado de São Paulo (Arsesp), Paula Campos;
O VIII Fórum do Biogás tem como tema “Biogás do futuro e o futuro do biogás”. Serão três painéis, presenciais e com transmissão simultânea online para inscritos no evento:
- Biogás do futuro – o papel do biogás na descarbonização de diversos setores, às 10h;
- Futuro do biogás no setor energético, às 14h;
- Futuro do biogás – Marco Legal do Biogás e Biometano, às 17h10
Já o público presencial vai poder assistir, além dos painéis, duas mesas redondas exclusivas:
- “Mercado de Carbono Brasileiro”, às 12h;
- “Por que investir em usinas de biogás?”, às 16h.
ABiogás em Brasília: Projeto de lei 528/2021, que institui o Mercado Brasileiro Regulado de Emissões (MBRE)
Posição: FAVORÁVEL
O PL 528/2021, do deputado federal Marcelo Ramos (PL/AM), ainda está sob análise da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Câmara dos Deputados.
O texto ainda é passível de modificações, mas a ABiogás é favorável à criação de um mercado regulado de carbono no país. O texto original sugere o estabelecimento de um mercado voluntário de redução de emissões, que já existe no Brasil. Portanto, é necessário que a legislação estabeleça um mercado regulado de comércio de emissões.
Um ponto crucial que deve ser considerado, seja no PL 528/2021, seja em outros mecanismos de criação do mercado de carbono regulado no Brasil, é a metodologia de avaliação de ciclo de vida, que já é utilizada no RenovaBio. O uso dessa metodologia vai promover a integração com a sistemática do RenovaBio, criando equivalência do Crédito de Descarbonização (CBio) do programa com o eventual crédito de carbono a ser criado com a nova regulamentação.
O mercado regulado deve abranger todos os setores da economia, expandindo o alcance atual da experiência bem-sucedida do RenovaBio, restrita ao segmento de transportes. A ampliação da abrangência reduz custos, já que aproveita a eficiência energética e de redução de emissões de todos os segmentos econômicos, aumentando a otimização do mercado de carbono.
HIGHLIGHTS
US$ 72 bilhões
Potencial de venda de créditos do Brasil de carbono até 2030, segundo levantamento do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS)
R$ 40,57
Valor do CBio negociado na B3 em setembro, valor 48% maior ao registrado em agosto
6.400 Nm³/h
Consumo de biogás oriundo de aterro sanitário das três termelétricas da Veolia